quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

FARISEUS E SADUCEUS

INTRODUÇÃO
Os judeus da Palestina, nos dias de Jesus, dividiam-se basicamente em três principais partidos:  Fariseus, saduceus e essênios. O partido dos essênios, nas últimas décadas, tem sido foco de muitos estudos e pesquisas, devido às descobertas arqueológicas das cavernas de Qumrã.  No entanto, apenas os dois primeiros partidos nos interessam nesta abordagem; os fariseus e os saduceus. E o motivo é que são exatamente estes dois grupos que aparecem, nos evangelhos, como opositores do Senhor Jesus. E não somente se opuseram a pessoa e ministério de Jesus, mas também, por longos dias continuaram se opondo à mensagem do evangelho proclamada pelos discípulos.
Não obstante, mesmo que ambos os grupos se opusessem ao ministério de Cristo, não significa que eles concordavam entre si teologicamente. Essa diferença doutrinária entre eles era tal, que às vezes chegavam até a discussões acaloradas (Atos 23.6-10). Havia algumas diferenças entre o grupo dos fariseus e os saduceus com respeito ao que se devia crer. Enquanto os fariseus transmitiam ao povo um grande número de observâncias recebidas oralmente dos antigos, ou seus antepassados, os saduceus as rejeitavam por não fazerem parte ou não constarem na palavra escrita, ou nas leis de Moisés [Coenen, pág.800].
Porém, devemos observar que embora houvesse divergência entre os dois grupos, por terem pontos de vistas conflitantes, deve-se notar que ambos reconheciam a santidade do templo e do código de Moisés, e observavam os ritos fundamentais do judaísmo [Cohen, pág.68].

Fariseus:
O grupo de maior destaque que aparece, no Novo Testamento, é o dos fariseus. Tal proeminência se deve ao fato de ser o grupo religioso de maior importância dentro do judaísmo, no que diz respeito à fé. Sua influência era tal, que o historiador Flavio Josefo declara; Cidades inteiras dão testemunhos valiosos de sua virtude, de sua maneira de viver e de seus discursos [Josefo, pág.416]. Josefo enfatiza bastante as virtudes dos fariseus. No entanto, se observa a seu respeito que ele mesmo, Josefo, era um fariseu [Coenen, pág.799]. Mesmo assim, fica evidente que este grupo tinha grande influência sobre o povo em geral, como Dana muito bem observa; Os fariseus eram considerados mestres incomparáveis e modelos do povo, o qual reconhecia neles os guardiões leais e verdadeiros das tradições de Israel [Dana, 96].

Algumas características dos fariseus:
Legalismo extremo:
Conforme podemos observar nos evangelhos, os fariseus se caracterizavam por sua postura extremamente legalista com respeito à Lei. Eles observavam os preceitos com tanta atenção aos detalhes que dizimavam de todos os bens (Mt. 23.23; Lc. 18.11-12), prestando atenção a todos os regulamentos da purificação, todas as datas sagradas preceituadas por Deus, e as ações rituais. Tanto era que algumas vezes o Senhor Jesus teve de mostrar-lhes que eles estavam falhando para com a própria Lei por causa de sua visão limitada da aplicação dela, ou seja, do principio da Lei.
Ênfase na especial providência divina:
Na visão dos fariseus, tudo é feito por ordem de Deus. No entanto, depende da vontade do homem o entregar-se à virtude ou ao vício [Josefo, pág.416].
Crença na existência dum mundo espiritual:
Outro aspecto digno de nota com respeito à fé dos fariseus é que estes acreditavam na existência de um mundo espiritual. Portanto criam em uma vida futura, ou seja, as almas dos homens são imortais, e que serão julgadas em um outro mundo e recompensadas ou castigadas, conforme o que se fizer. Diante disso, acreditavam na ressurreição dos justos de Israel. Também aceitavam a existência dos anjos e espíritos.
Vida simples:
Os fariseus também eram um povo que vivia com simplicidade de vida, desprezando assim as iguarias.
Apego a tradições:
Outra característica marcante dos fariseus, conforme podemos observar nos evangelhos, era o apego que eles tinham à tradição e a antiguidade. Esse aspecto do farisaísmo foi uma das principais causas de seu confronto com Jesus. A estima que eles davam a antiguidade e a tradição era tamanha que um grande número de observância que transmitiram ao povo tinham como fundamento a tradição e não a própria Lei (Mc.7). Esta postura dos fariseus, também foi questionada por Jesus, o qual afirma que eles estavam negligenciando o mandamento de Deus, e guardando tradições dos homens (Mc. 7.8).
Vida em comunhão:
Outra característica marcante dos fariseus é que eles eram um grupo que valorizava e incentivava bastante a comunhão entre si. Havia grande comunhão dentro do grupo.
Saduceus:
Em segundo lugar, destaca-se o grupo dos saduceus. Tal observação pode ser feita tanto através da história como nos quatro evangelhos. Os saduceus orgulhavam-se de sua lealdade à letra da Lei do Velho Testamento, em contraste com a tradição oral do rabinismo, que os fariseus, por sinal, se apegavam tanto.

Algumas características dos saduceus:
Aristocráticos:
Os saduceus aparecem pela primeira vez sob João Hircano. Era um grupo de procedência aristocrática, durante todo século I ªC e uma boa parte do século I d. C., eram recrutados de preferência na casta sacerdotal. No tempo de Jesus, eles controlavam a administração e o culto do templo [Paul, A. pág.14].
Visão limitada de Deus e da religião:
Outro fator interessante entre os saduceus era a visão limitada que estes possuíam acerca de Deus e da religião.
Rejeição da doutrina da imortalidade:
Para os saduceus, a crença dos fariseus com respeito a imortalidade era fruto de influência da filosofia grega. Ensinavam eles que; as almas morrem com os corpos. A única coisa que se é obrigado a fazer é observar a Lei.
Aceitação apenas do Velho Testamento:
Como observamos acima, esta era uma das principais razões da divergência entre os dois grupos. Enquanto os fariseus transmitiam ao povo um grande número de observâncias recebidas oralmente dos antigos, ou seus antepassados, os saduceus as rejeitavam por não fazerem parte ou não constarem na palavra escrita, ou nas leis de Moisés.
Extremo rigor judicial:
Também é importante notar que os saduceus, contrariamente aos fariseus, colocavam o estado à frente da religião, e naturalmente eram favorecidos pelo rei e pela corte [Cohen, Abraham. 70].
Mateus, 22.23-33:
Em Mateus 22.23-33, encontramos um episódio muito interessante. Logo depois de uma tentativa frustrada dos fariseus em pegar Jesus em alguma contradição (Mt22. 15-22), encontrando assim motivos para condena-lo perante as autoridades, entra em cena um outro grupo, os saduceus. E, como já destacamos acima falando sobre suas características, os saduceus atinham-se à tradição escrita, particularmente o Pentateuco, afirmando não encontrar ali a doutrina da ressurreição, e, portanto, opunha-se tenazmente a essa doutrina (Atos, 4.1-3). Por isso, aqui nesta passagem aparecem “com uma trama para” pegar Jesus em contradição, procurando ridiculariza-lo perante o povo. Na Lei encontramos a orientação expressa de Deus quanto ao fato de um homem morrer sem deixar filhos. Diz a Lei que; Quando dois irmãos moram juntos e um deles morre, sem deixar filhos, a mulher do morto não sairá para casar-se com um estranho à família; seu cunhado virá a ela e a tomará, cumprindo seu dever de cunhado. O primogênito que ela dé à luz tomará o nome do irmão morto, para que o nome deste não se apague em Israel (Dt. 25.5-6).
Para os saduceus, que não criam na ressurreição, a questão era logicamente conclusiva. Ao usar o argumento da mulher, que seguindo a lei de Moisés casara-se sete vezes, deixariam Jesus sem respostas. Pois, admitindo a doutrina da ressurreição, Jesus teria problema em resolver a questão. De quem a mulher seria esposa afinal quando na ressurreição, já que tivera sete maridos durante sua vida? No entanto, o Senhor Jesus esclarece a questão para aqueles saduceus incrédulos e ignorantes. Eles ignoram duas coisas:
As Escrituras:
A primeira coisa que o Senhor Jesus deixa evidente acerca dos saduceus é que estes são ignorantes com relação à própria Escritura. A doutrina da ressurreição não é algo que se originou na mente humana. Não é feito da imaginação humana. Tal doutrina fundamenta-se nas Escrituras, e especialmente o Senhor cita o corpo das Escrituras ao qual os saduceus se apegam. Quanto à ressurreição dos mortos, não lestes o que Deus “vos declarou”; Eu sou o Deus de Abrão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó? Ora ele não é Deus de mortos, mas sim de vivos. Mateus, 22.31,32. cf. Êxodo, 3.6).
O poder de Deus:
Outra coisa que os saduceus ignoravam é o fato de que a ressurreição é obra do poder sobre natural de Deus, o que eles desconheciam, e como tal, é algo que está além da realidade ou experiências puramente humanas. Essa ignorância dos saduceus não é de se estranhar, já que eles eram um grupo de pessoas que tinha uma visão limitada da religião e da própria pessoa de Deus.
Depois que o Senhor lhes respondeu, os saduceus, percebendo sua ignorância, inclusive acerca da própria Escritura que afirmavam defender, ficaram de boca fechada.

Atos 23.6-10:  
Já em Atos 23.6-10, encontramos uma outra situação que nos chama bastante a atenção. Encontramos aqui uma situação na qual o apóstolo Paulo se encontra para ser julgado por um grande número de judeus. Inicialmente ele havia sido falsamente acusado de profanar o templo (Atos 21.27,28). Agora, diante de um momento de grande tensão, Paulo percebe que um grande número de judeus que se encontrava presente para julga-lo divide-se em dois grupos de posição doutrinária completamente oposta entre si, Fariseus e saduceus. Sendo assim, o apóstolo, com muita inteligência, já trata de ganhar apoio de um dos grupos e por sinal o mais influente entre o povo. Paulo, naquilo que era coerente com as Escrituras, era um fariseu, e, sendo assim, declara diante do sinédrio que o motivo de ele está sendo julgado é pelo fato de crer na ressurreição dos mortos, doutrina esta que deixava os saduceus furiosos, pois estes afirmavam que tal pensamento era simplesmente influencias do pensamento pagão e não encontravam apoio nas Escrituras. A declaração do apóstolo de que era fariseu, e acreditava na ressurreição, repercute de tal maneira que os dois grupos se voltaram um contra o outro, e os fariseus, de certa forma, passaram a falar a favor do apóstolo (Atos, 23.9).
O fato é que em vez de julgarem o apóstolo, e condená-lo, os judeus ficaram divididos entre si.

Conclusão:
Diante destas observações percebemos que o grupo dos saduceus era o que mais se distanciava das verdades bíblicas. Embora se julgasse um grupo fiel às leis de Moisés, de fato, na prática as ignoravam. Por outro lado, os fariseus, apesar de seus erros doutrinários, contribuíram de certa forma para a mensagem do evangelho. Isso porque se constituía o partido mais influente do judaísmo. E, como foi observado, sua teologia preparou o pensamento judaico da época para receber a mensagem do Senhor Jesus que não somente pregava a ressurreição, mas, ele próprio é a ressurreição e a vida (Jo. 11.25,26).  E neste episódio de Atos 23.6-10, podemos até observar que os fariseus se colocaram a favor de Paulo contra os saduceus, e isso por causa da doutrina da ressurreição.
Em suma, a crença dos fariseus com respeito à ressurreição, anjos e espíritos, dava um embasamento à mensagem cristã.
 

BIBLIOGRAFIA


Paul, André. O que é o Intertestamento? 2ª Edição, São Paulo: Edições Paulinas, 1981.
Dana, H. E. O Mundo do Novo Testamento: um estudo do ambiente histórico e cultural do Novo Testamento. 2ª ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1997.
Rienecker, Fritz e Rogers. Cleon, Chave Lingüística do Novo Testamento Grego, traduzido por Gordon Chown e Júlio Paulo T. Zabatiero, - Vida Nova, São Paulo, 1995.
Brown, Colin & Coenen, Lothar. Dicionário internacional de teologia do Novo Testamento. Vida Nova, São Paulo. 2000
COHEN, Abraham. Dois caminhos: o judaísmo e o advento do cristianismo. Rio de Janeiro: Edições Bíblicas, Ltda., 1964.
PAUL, André. O que é o intertestamento? 2ª ed. São Paulo: Edições Paulinas – 1981.

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